sábado, 4 de maio de 2013

A tomada de Ceuta: Início da Expansão Marítima ou causa dela?

O dia era 23 de julho do ano de 1415. De Portugal, uma gigantesca frota de navios partia em direção a Ceuta, entreposto árabe no norte da África. Amontoados em mais de 200 embarcações, 30 mil marinheiros e 50 mil soldados com cruzes pintadas e coladas ao peito (alguns historiadores falam em somente 20 mil homens), davam o aspecto de Guerra Santa á expedição, e de certa forma era isso mesmo que ela simbolizava. Explico. Naquela época, a Igreja em conflito de poder interno, possuía três papas: Gregório XII (em Roma), Bento XIII (em Avignon) e João XXII (em Pisa). As ameaças constantes a soberania portuguesa por parte da Coroa de Castela, forçara Portugal a estabelecer uma série de alianças, sendo que o casamento de Dom João de Avis e de Filipa de Lancaster, neta do Rei Eduardo III, era o selo da aliança com a Inglaterra. Enquanto Dom João apoiava o Papa Gregório, Castela apoiava o Papa Bento. Vislumbrando aumentar o seu prestígio junto á Igreja e afastar de vez a ameaça de Castela ao seu trono, Dom João chegou á conclusão de que um ataque vitorioso aos árabes infiéis possibilitaria essa estabilidade.

Painel representando a tomada de Ceuta
       A possibilidade de se apoderar de Ceuta animava os mercadores lusos entusiasmados com os possíveis lucros, assim como atendia o desejo do Rei que desejava provar o real valor de seus filhos Infantes em uma batalha. E mais: nos dias em que se antecederam ao embarque, o Papa Gregório XII publicou uma bula concedendo absolvição a todos que morressem no combate contra os infiéis. Após quase um mês no mar, no dia 14 de agosto, os portugueses invadiram a fortaleza que protegia a cidade de Ceuta. A cidade caiu sem muita resistência.
      Ceuta na verdade era a chave e a porta de entrada de todo comércio africano: a ela chegavam mercadorias de todo continente, além de mercadorias persas, indianas e até de Veneza. Mais de 24 mil lojas, nas quais se vendiam desde metais preciosos a especiarias se espalhavam pela cidade. Suas residências com paredes adornadas, tapetes orientais e fontes em pátios internos, tornava qualquer casa de Portugal um barraco. Sobre isso Gomes Zurara, biógrafo oficial do Infante D.Henrique, relatou: “Perto de essas, as melhores casas de Portugal parecem pocilgas”. Ceuta fora saqueada com os portugueses invadindo casas, lojas e bazares atrás de metais preciosos e de cadáveres foram arrancados orelhas e dedos para arrancar-lhes jóias. No fim do dia, a bandeira de Portugal era erguida demonstrando a quem pertencia Ceuta agora.
      Para concretizar e não perder a simbologia daquela conquista, no dia seguinte a Mesquita da cidade foi transformada em Catedral cristã.A notícia da tomada de Ceuta foi divulgada por toda Europa, elevando Portugal e o Rei Dom João a outro patamar aos olhos dos Reinos Cristãos e da Santa Sé. Os mouros tentaram retomar a cidade por duas ocasiões, nos anos de 1418 e 1419. Além disso, consistia um grande problema a manutenção da cidade para a coroa, uma vez que ela era extremamente onerosa, já que a coroa enviava suprimentos, armas e soldados para a defesa da cidade. Após a recusa de muitos em administrar a cidade ela foi entregue por Dom João I nas mãos de Dom Pedro de Meneses, o conde de Viana.
  
      Porém com o fim do controle árabe-muçulmano na cidade, as caravanas carregadas de ouro que se dirigiam a cidade, tomaram outra direção: Tanger e Tunis. A cidade ficou estagnada. Em 1418, já feito Cavaleiro, D. Henrique retornou a cidade. Percebendo o problema no comércio da cidade, o Infante arrancou sob tortura dos mercadores da cidade de onde vinham as riquezas da cidade: á 20 dias ao sul da cidade, montados em camelos e atravessando as montanhas da cordilheira Atlas, os mercadores chegavam a algum lugar próximo a cidade de Timbuctu, no Mali. Ali os mercadores expunham mercadorias sem muito valor. Os homens das tribos locais se aproximavam e colocavam ao lado das mercadorias a quantidade de ouro que julgavam valer. Conforme a quantidade de ouro a proposta era aceita, e os compradores retiravam-nas. Quando não, os mercadores reduziam a quantidade de mercadoria, e o negócio só terminava quando a totalidade era retirada. Por não conhecerem as línguas um dos outros esse era o chamado “comércio mudo”. As caravanas que se dirigiam de Celta até a região chegavam a contar com até 12 mil camelos. 
        Sabendo das adversidades para se chegar ao local, e acreditando nos indícios de que a região ficava nas proximidades da foz de um rio que desaguava no Atlântico, ao sul das Canárias, Dom Henrique começou a acreditar que a melhor maneira de chegar á região e bloquear a passagem dos árabes, seria por mar margeando as Canárias e a costa da Guiné. Por esse novo desafio estava lançada a pedra fundamental da expansão ultramarina portuguesa, que inicialmente pretendia chegar á região conhecida a época como Guiné, no litoral do Senegal e tomar o controle do comércio das mãos dos marroquinos. Foi somente no reinado de Dom João II, entre os anos de 1481 e 1495 que os planos para atingir as Índias começaram a ser pensados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário